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quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Dia desses


Dia desses eu estava aqui, toda brava, por toda gente que não sabe de todas as coisas  eu sempre tenho para fazer e por fazer, e que ainda assim fala todas as palavras e pensa todos os pensamentos sobre tudo aquilo que nem eu digo e penso. Não me cuidam, mas não deixam de me apontar os dedos.

Não me incomodam mais, porque o dia de me incomodarem já passou. 

Tantos sentimentos, de tantas formas, que se transformaram em tantos substantivos diferentes. Com ou sem adjetivos. 

Não expressei minha braveza. Guardei ali num canto e ficou tudo no ontem. Ou foi embora com o vento que me arranhou a face, já judiada por tantos sorrisos que precisou criar para esconder tantas  cicatrizes de dias desses que já não são mais hoje.

Hoje, que já não é mais dia desses, eu lembrei. E eu sorri. E eu gosto quando lembro e sorrio, mesmo sabendo que não me deu nenhum motivo para sorrir. Nada mudou, porque pouco muda. Ou pouco importa o que muda se não muda aqui dentro do que é meu. E se tivesse mudado, o que diriam? Por que diriam? Não importa, porque sempre diriam.

Umas tantas dessas perguntas brotam em dias como as noites de hoje. E umas tantas dessas pessoas brotam nos caminhos que não são mais os caminhos de hoje.

Dia desses reencontrei, nesses novos meios que existem para reencontros, gente que um dia foi dia do meu dia, e que hoje tem tantas outras coisas para fazer e por fazer. E tantas outras gentes que são dias dos seus dias. E rimos e lembramos e revivemos, cada um na sua lembrança, os dias de anos atrás, que ficaram no hoje apenas como memórias boas.

Tantas desventuras e tanta falta de responsabilidade numa época em que nos era permitido ser irresponsáveis. E fomos. E hoje sentimos orgulhos de termos sido, porque formou um pouco do que somos e do que nos tornamos e daquilo que sabemos que não podemos mais fazer. Porque aquele tempo passou.  E que bom que aquele tempo existiu. E que bom que aquele tempo passou.

Hoje, que não é mais dia desses, o que era pôster de banda de rock colado na parede do quarto se transformou em borboletas e quadros com imagens que bebês nas paredes dos quartos que não podem mais ser tão rebeldes como foram dia desses.

Os dias por vir serão como os dias que foram dias desses. Mas estaremos do outro lado. E saberemos como lidar, porque já estivemos lá. Não pensamos mais no emprego que teremos que procurar. Hoje é filha que cresce, planos que mudam.


No fim das contas, ainda não estou no fim das contas. Mas já gosto dos dias que foram ontem. Mesmo daqueles que me fizeram chorar. Muitos deles fizeram. Lágrimas de cores diferentes, de gostos diferentes e que cortaram a pele de forma diferente. Umas por dentro, outras por fora. Umas rasgando a pele, outras apenas refrescando os olhos.

Um mundo que a cada dia é mais mudo. Um dia que a cada dia é mais meu. Um meu que a cada dia é mais do mundo que eu faço para mim.

Dia desses eu me lembrei do amor jurado, do amor desperdiçado, do amor prometido, do amor não vivido, do amor fugido.

Hoje, que não é mais dia desses, mudei a minha concepção do amor, e não acredito mais nele, mas não costumo dizer isso às pessoas, porque elas têm seus próprios dias desses. E seus próprios amores. E seus próprios meios de acreditar, ou de se enganar de forma tão verdadeira a ponto de acreditar que o que é realmente dor pode ser chamado de amor.

Respeito. 

E é bom ter vivido dia desses para poder relembrar.