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domingo, 24 de março de 2013

Olhos de cigana oblíqua e dissimulada


Feridas abertas. Sua vez de sofrer.

Nossa história é mais curta e com menos personagens que a história da Quadrilha de Carlos Drummond de Andrade. Não tem João, nem Maria, nem Lili que não amava ninguém. Tem eu, que amava você, que não era digno do amor de ninguém.

Fomos mesmo feitos para acabar. E acabamos. 

Hoje, eu tenho tudo aquilo que existiu somente na sua mente doente. Uma vida de verdade, que não te cabe, na qual você não mais cabe. E você? Tem o quê? Reformas e jantares como mero expectador.  Duas vidas desistidas. Tentativas inúteis de reconstruir o que nunca foi concreto. Fugindo sempre de mentiras espalhadas, temendo que elas cruzem o seu caminho.

Em mim não. Certeza de que o meu melhor foi feito. E não fiz mais porque o meu melhor é demais para você. Resta a lágrima idiota que insiste em cair. E nem isto mais você merece ver. Ou saber. Muito menos ter.

Suas respostas não ditas, eu já sei. E a cada descoberta, uma nova decepção. Mas ainda o coração, que não te dispensa como foi dispensado, porque é nobre. Preocupa-se ainda com você, justamente com você, que não se preocupou com ele.

Uma mudança da qual você não fará parte, um espetáculo no teatro que você não vai assistir, uma viagem de sonhos que você não vai sonhar, e fotos de um sábado no parque que você nunca mais vai ver. Apagadas. E jogadas ao vento. Como você nos jogou. E voou. Resta a lembrança que aos poucos em mim se apaga, mas que no vazio de você vai ecoar por muito tempo. Quiçá para sempre.

Serviu de que? 

Eu fui apenas uma troca mal sucedida. Trocou-se a felicidade pela dívida. Uma dívida que nem sequer a ti pertence. Nada são. Nada não. E todas as juras tornaram-se nada menos que um certo cinismo velado. Resolve-te agora com tua dívida, enquanto eu sigo. Pois o que fiz foi ação múltipla de resultado nulo.

Não são lamentos. São apenas os dias se passando. Minutos que doloridamente me mostram que o desperdício veio de você. Pois o que eu tenho permanece meu, mas o que você tinha era nada. E continua sendo nada.

Sorrisos que você não vai sorrir. Amores que você não vai amar. 

Mágoa? Sim. Mas ainda consigo ver quem eu sempre fui. E na menina que uma dia acreditou ainda existe bondade para ver em ti não apenas o sujo, mas o pequeno covarde que jogou fora, mais uma vez, a chance de se fazer gente. 

E enquanto isso, a cigana oblíqua e dissimulada continua com o mesmo olhar.  

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